A vida me envolve como um manto opaco, uma teia de dias indistintos. Eu, presa no meu próprio corpo, sem lugar para ir, carrego esse desejo que nunca se sacia, que nunca é visto. Porque o desejo é uma forma de existência que não se completa, uma fome que se alimenta da ausência. Ele cresce na escuridão, se espalha como raízes invisíveis, me amarra a esse vazio, enquanto tudo ao meu redor segue o mesmo roteiro ensaiado de promessas vazias, de objetivos que nunca chegam, de uma busca incansável pelo sentido que escorre pelas mãos como areia.
Meu corpo é uma prisão que carrego para todo lado, uma cela onde o desejo pulsa, indomável, mas nunca satisfeito. E ela, a quem não posso ter, é a única saída que vislumbro nessa escuridão sufocante, entre jornadas automáticas de dias cheios de vazios e noites sem descanso, onde a promessa de um sentido se dissolve nas luzes artificiais de um mundo em transe, que se agita, mas não desperta, cativo de suas próprias ilusões.
Penso nos olhos dela, castanhos e insondáveis, que me puxam como o fundo do mar. Eles não me veem, não sabem da fome que sinto, mas, ainda assim, me transformam, me fazem querer ser outra, alguém que pudesse tocá-la, despertá-la. Imagino o olhar dela cravado em mim, o desejo cintilando nas profundezas, um farol que me guia. Se ao menos seus olhos me devorassem como eu a devoro em segredo, cada vez que ela passa por mim, a respiração presa na garganta, meu corpo tenso, vibrando com a presença dela.
Eu fecharia a distância entre nós, seguiria o traçado do seu olhar pela minha pele, sua voz seria um sussurro no meu ouvido, um chamado silencioso. E eu não teria medo de me perder, de afundar nas correntes que ela criaria com as pontas dos dedos, que se enredariam ao redor de mim, me puxando para mais perto, cada vez mais fundo. Meu corpo treme só de imaginar seu toque deslizando pela minha cintura, sua mão descendo devagar, apertando com a mesma força com que eu a desejo.
Se ela me chamasse, eu deixaria tudo para trás. Me atiraria nesse abismo sem hesitar, me perderia na escuridão de seus olhos. Cada contorno do meu corpo vibraria ao som de sua voz, à promessa de seus lábios próximos aos meus, sua respiração quente tocando minha pele. Eu seguiria até o fim da Terra, sem olhar para trás, sem pensar no que deixo para trás. E seria louca de não seguir, de não me perder nesse abismo que é o que resta de mim quando penso nela.
Mas ela não me chama. Nunca vai me chamar. E eu fico aqui, sozinha com o meu desejo, essa sombra que me acompanha em todos os lugares, que me mantém cativa. O desejo é um buraco negro, uma ausência que consome tudo ao redor, um eco que nunca cessa. Ele cresce no escuro, como um parasita, se alimentando do que não pode ter. É um vazio que pulsa, que me deixa ofegante, um grito abafado que só eu escuto.
Fecho os olhos e tudo se torna mais real. Posso sentir o calor de sua pele próxima à minha, o cheiro dela, o jeito que a ponta dos seus dedos roçaria a minha coxa, o toque que esculpiria lembranças nas entrelinhas da pele. Imagino seu corpo nu ao lado do meu, os seios dela pressionando os meus, o som da respiração ofegante perto do meu ouvido. Eu a vejo me olhando com aquele olhar que me tiraria o chão, atraindo-me ao êxtase de ser naufrágio e tempestade.
Minha mão desce pelo meu ventre, hesitante, como se buscasse permissão para seguir. Mas sou eu quem se toca, sozinha, perdida nesse espaço entre o real e o imaginado. Eu me vejo refletida nela, como um espelho distorcido, onde meu desejo por ela se confunde com o desejo dela por mim, um ciclo sem fim, um labirinto onde me perco e me encontro. A solidão me envolve como um lençol frio, e só a ideia dela, do seu corpo, do toque, do gosto, pode me aquecer. O prazer é uma forma de esquecer que existo só, sem ela. E, no fundo, é tudo o que eu quero: ser engolida por esse desejo, desaparecer nele, ser reduzida a nada além do que sinto quando penso nela.
Deito-me na cama, deixo que meus pensamentos a envolvam, cada detalhe do seu corpo se materializando na penumbra do meu quarto. A boca dela é quente e voraz, deixaria uma trilha de fogo por onde passasse. Imagino seus lábios sugando levemente meu mamilo, os dedos dela apertando minha pele, descendo devagar pelas minhas costelas, pelo meu ventre, parando logo acima do que mais arde de desejo. Meus dedos imitam o caminho que imagino que a língua dela faria, descendo pelo meu pescoço, explorando meus seios, circulando devagar até onde dói de tanto querer.
Aperto minhas coxas, e é como se fossem as dela entrelaçadas às minhas, o calor úmido que se acumula, o movimento lento e crescente que nos faria tremer juntas. Meus dedos se insinuam devagar, e por um momento é como se fossem os dela, como se eu a estivesse tocando, explorando cada curva, cada contorno. Pressiono o clitóris com a ponta dos dedos, como ela faria, e um gemido escapa, baixo, engolido pelo quarto vazio. Eu imagino seu sexo contra o meu, sinto sua pele quente e molhada contra a minha e me imagino engolida por ela. Me afundo no meu próprio toque, no desejo que se expande como uma onda prestes a quebrar.
Meus dedos deslizam mais rápido, mais fundo. Imagino seus quadris pressionando contra os meus, o ritmo aumentando, a respiração se tornando ofegante, quase desesperada. O quarto se dissolve ao meu redor, não há mais nada além do que eu sinto, do que eu desejo, do que me consome.
Cada movimento se torna mais urgente, mais desesperado. Aperto o clitóris com mais força, sinto as contrações se aproximando, o corpo tenso, fechando-se em torno de si mesmo com meu sexo como centro. Ela se curva para trás, me oferecendo os seios, os mamilos duros entre meus lábios, minha língua brincando enquanto minha mão acelera o ritmo, afundando dentro dela, dentro de mim. Imagino sua boca no meu pescoço, mordendo, sugando, enquanto eu a faço tremer, perder o controle, implorar por mais. Os quadris dela se movendo, o roçar sensual de vontades, a umidade escorrendo, meus dedos cobertos dela, de nós.
E em um movimento ela está por cima de mim, faminta do meu prazer. Sinto o peso do seu corpo afundando o meu no colchão, como se suas mãos e boca fossem correntes marítimas me arrastando para um abismo que eu não quero evitar. Sua boca desliza pelo meu pescoço, quente e úmida. Ela desce devagar, como se explorasse cada centímetro, cada detalhe, e eu sinto os seios dela nos meus, os mamilos duros se encontrando, enviando choques que me fazem arquear as costas.
Cada toque é uma promessa, um convite. Ela segue adiante, descendo, e eu já não sei onde termina meu corpo e começa o dela. Me deixo levar, afundando mais fundo a cada segundo, como se estivesse sendo tragada por um redemoinho de desejo. Ela me guia, e eu a sigo até o fim da Terra, sem hesitar, sem olhar para trás. Não há outro lugar onde eu queira estar, a não ser aqui, entregue a cada movimento, a cada pressão, a cada beijo que me arranca suspiros e gemidos. Sinto seus dedos ir e vir no meu clitóris, enquanto sua boca devora meu seio, antes de descer pelo meu ventre e sua língua assumir o lugar ali no meu ponto que implora que chegue ao fim e nunca acabe, ao mesmo tempo. Eu me afogo nela, perdendo o fôlego, perdida no desejo que cresce, que inunda, que transborda e me consome por completo.
O prazer cresce e me preenche, uma tensão que se acumula, uma força que não consigo conter. É como se cada fibra do meu corpo se distendesse até o limite, vibrando em uníssono, à beira do colapso. A primeira onda me toma de assalto, me fazendo arfar, perder o controle. Eu paro, imóvel, o corpo inteiro tremendo enquanto sinto as contrações se espalharem, lentas e profundas, me dominando.
O tempo para, se dilata. Tudo se torna denso e silencioso, como se estivesse submersa em um oceano escuro e desconhecido. Lentamente, deslizo para as profundezes. Os peixes estranhos do fundo do mar me encontram ali, nesse espaço suspenso, e se alimentam de mim, devorando tudo que sou. E eu me deixo ir, me desfaço, afundando mais e mais, até não haver mais nada além da sensação de ser tomada, fragmentada, absorvida por completo.
Mas ainda não satisfeita, meus dedos, trêmulos e ávidos, escorregam lentamente para dentro de mim e eu fecho os olhos, tentando acreditar que é o corpo dela que eu toco. Em meio a minha languidez, me imagino ali, a explorá-la, a sentir cada curva, cada contração, e enquanto meus dedos entram, é como se fosse dentro dela que eu me perdesse. Meu interior se torna o dela, minha carne se molda à fantasia de ser eu a levá-la ao êxtase, de sentir seus músculos se apertarem ao meu redor, seu prazer crescendo sob meu comando.
Cada movimento meu desenha um prazer que é meu e dela ao mesmo tempo, uma dança silenciosa entre o que sou e o que desejo ser para ela. Sozinha, no silêncio do meu quarto, eu a possuo e me deixo possuir, imaginando-a entregue ao meu ritmo, como se cada toque meu fosse para fazê-la gemer, como se cada pulsar dentro de mim fosse a resposta ao prazer que a envolvo.
A segunda onda vem como um vendaval, arrastando tudo em seu caminho, e me leva mais fundo, mais longe. Eu me perco na ilusão dos nossos corpos entrelaçados, e cada toque é uma súplica silenciosa, um gesto de entrega e desespero. A pressão cresce, insuportável, e sinto que estou novamente caindo, caindo, vertiginosamente, até o fundo daquele oceano. O prazer me envolve como um manto, me despedaça em mil pedaços de luz e sombra. Tudo se desfaz em uma explosão silenciosa, um abismo que me engole inteira, onde o tempo se estende em um vazio absoluto. Eu caio e caio, até bater no fundo. E escapo.
Por um instante, sou tudo e nada, liberta de todas as correntes que me prendiam. Não sou mais carne ou nome, livre do medo de não ser suficiente, das vozes que me dizem o que devo querer. Sou um sopro sem forma, além das expectativas, dos espelhos que não devolvem a verdade, apenas fragmentos distorcidos, nos ruídos de uma vida contida em números e metas. Nada mais me pesa: não há pressa, não há obrigação de ser ou pertencer. Flutuo, suspensa, liberta da ansiedade que me consome, do vazio que me cerca, do tempo que me escapa. Sou puro esquecimento, desprovida de sentido, inteira em minha ausência.
E, então, o mundo retorna. O quarto ao meu redor, o silêncio espesso, a solidão. Volto a ser só eu, com meu desejo insaciado, na escuridão, desejando ainda o que não posso ter…
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